terça-feira, 7 de julho de 2009

Crítica | A Noite dos Palhaços Mudos por Fabrício Muriana

Mais é mais, mesmo quando é menos
Foto: Carlos Gueller
Pesquisa que sempre se renova em cada um dos que se arriscam com o nariz vermelho, o palhaço tem o dom de permanecer incompleto ao longo da história das artes cênicas. Palhaço sem público reagindo, rindo, completando a obra é quase uma zorra-tot… ops, um não-palhaço. O único personagem que pode se dar ao luxo de ser ingênuo do início ao fim da uma apresentação e, o melhor, quanto mais naïve (ui), mais contagiante. Nesse ano que rodamos por aí, encontramos palhaços sem nariz, palhaços “clássicos“, palhaços “corifeus“, palhaços “políticos“, palhaços “críticos“, palhaços “palhaços“, mas ainda não tínhamos topado com palhaços mudos.
A sacada da história de Laerte, criada em 1987, impõe mais um desafio a quem quisesse adaptá-la ao teatro. O trabalho ficou a cargo da Cia. La Mínima, que transpôs boa parte das cenas concebidas por Laerte em A Noite dos Palhaços mudos, mas soube recriar a história à sua maneira. Nela, valeram-se de efeitos cinematográficos - o próprio palco italiano e as movimentações dentro dele nos remetem à “janela para o mundo” - e não tiveram medo de tirar um personagem que, a princípio, parecia central na história de Laerte e colocar um nariz em seu lugar. E como a peça veio depois de Matrix, todos os personagens que se assemelhavam com o agente Smith - os únicos que não são mudos na história de Laerte - foram unificados num só ator (que também é um palhaço, diga-se, sem nariz).
Mais que uma possível crítica às corporações e seus funcionários, na forma da peça - palco quase sempre limpo, pouquíssimos elementos cênicos, jogos de luz sem virtuoses - descobrimos que o potencial crítico do palhaço também está na criação de mundos a partir de muito pouco - fique bem claro que não estou dizendo “menos é mais”. A chave da montagem é o jogo que se estabelece com o público e o entrosamento do trio que parece ter se preparado além da conta.
Laerte estava presente na estréia e foi legal constatar que o cara - repito O Cara - consegue se divertir com a recriação de sua própria história. Ele, provavelmente melhor que todos naquela sala, sabe que sua história foi reapropriada, reeditada, recriada e que agora ele passou a ser no máximo um co-autor, o que já é um grande mérito, tendo em vista o resultado apresentado. Os quadrinhos brasileiros mal começaram a mostrar o seu potencial nos palcos e no cinema, mas pelo menos no caso dessa adaptação já saímos desejando que venham outros com o mesmo ímpeto criativo.

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